
Em 2024, segundo dados da Maternidade Divino Amor, em Parnamirim, 23 bebês morreram na unidade, taxa que é considerada dentro do normal, segundo a direção. Audiência discute mortes fetais na Maternidade Divino Amor, em Parnamirim
Uma audiência pública nesta segunda-feira (31) na Câmara de Vereadores de Parnamirim discutiu a suspeita de negligência médica e a taxa de mortalidade de bebês na Maternidade Divino Amor, gerenciada pelo Município.
Depoimentos emocionados de mães que perderam os bebês ainda grávidas, pedidos de mais cuidado nos tratamentos e a cobrança por uma investigação deram o tom do debate na Casa Legslativa. (Veja depoimentos mais abaixo).
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Dados da maternidade apontam que em 2024 foram registrados 23 óbitos fetais, dois a mais que no ano anterior. Segundo a direção da unidade de saúde, a taxa de mortalidade está dentro da média nacional.
Em março deste ano, a direção da Maternidade Divino Amor informou que abriu investigação para apurar se houve negligência em mortes de fetos ocorridas recentemente.
A diretora-geral do hospital, Walquiria Oliveira, reforçou nesta segunda-feira (31), após a audiência pública, que os casos têm sido apurados por um Comitê de Ética empossado pelo Conselho Regional de Medicina (CRM).
“O Comitê de Ética, que é dentro da maternidade, que é um comitê legitimado e empossado pelo CRM, fez as apurações e encaminhou para o Conselho de de Medicina”, explicou a diretora-geral, que pontuou que não há prazo para o final da apuração pelo CRM.
Hospital Maternidade Divino Amor, em Parnamirim, na Grande Natal RN
Kleber Teixeira/Inter TV Cabugi
Audiência pública
Representantes da Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia, além da direção da Maternidade Divino Amor, estiveram presentes na audiência pública, assim como o secretário de Saúde de Parnamirim, Rogério Gurgel.
Do lado de fora da Câmara de Vereadores de Parnamirim, familiares de bebês mortos protestaram. As denúncias feitas são de violência obstétrica e mal atendimento na maternidade.
Dados que foram divulgados na audiência apontaram que a maternidade realizou:
Em 2023: 1.982 partos, com 21 óbitos fetais;
Em 2024: 1.907 partos, com 23 óbitos.
Segundo a direção, a taxa de mortalidade está dentro da média nacional.
Na área destinada ao público na Câmara de Parnamirim, familiares e amigos das mães que perderam os bebês seguravam cartazes pedindo justiça.
A audiência foi convocada pelos vereadores de Parnamirim Thiago Fernandes (PP), Gabriel César (PL) e Jonas Godeiro (Avante).
“Vamos buscar os caminhos vendo o que vai ser tanto debatido e discutido, achar os possíveis erros e juntos – o Legislativo com o Executivo, através das secretarias de saúde, os órgãos competentes – suprir essas deficiências que possam ser apontadas aqui”, disse o vereador Thiago Fernandes.
Depoimentos das mães marcam audiência; veja alguns
A audiência pública na Câmara de Parnamirim foi marcada por depoimentos emocionantes. As mães que perderam bebês recentemente se emocionaram ao relatar os casos. Veja alguns abaixo.
➡️ O caso de Gisele Oliveira aconteceu na Maternidade Divino Amor em 2016. O depoimento dela no plenário levantou aplausos de quem acompanhava a sessão.
“A gente não tem provas, porque a gente não entende. Nós somos leigas. Por que o obstetra não chega e diz: ‘Mãezinha, o seu caso é esse? Pode acontecer isso ou aquilo’. Ou quando acontece a morte, ele não chega e explica: ‘Aconteceu por isso, isso e isso’. Falta, sabe o quê? Empatia. Falta amor. E sabe o que falta? Amor divino. Divino amor. Isso está faltando. Vidas, bebês que não tiveram nem a oportunidade de se proteger”, disse.
“A gente ganhou uma voz, uma oportunidade de gritar socorro. Muito se falou de perda. Sabe o que é uma perda? É quando a gente perde algo e tem a expectativa de encontrar novamente. Talvez eu encontre, onde será que eu perdi? Ai, perdi meu celular, compro outro, perdi o meu carro para o ladrão, compra outro. O bebê o bebê não perdeu, o bebê foi morto. Ele morreu”.
➡️ A operadora de caixa Karolaine Santos perdeu o bebê neste ano após atendimento na Divino Amor.
“Onde é para nascer, para a gente sair com nossos filhos no braço, que é um momento único da mulher, é passar por uma gestação, ter seus filhos nos braços. E infelizmente a gente não pode”, disse.
“Então, alguma providência tem que ser tomada, espero que seja tomada, porque eu quero Justiça pela vida da minha filha, porque está sendo muito difícil passar pelo puerpério sem ela. E por todas as outras vidas que já se foram. Infelizmente, depois que eu perdi minha filha, não recebi nenhum apoio, nenhuma mensagem me mandaram”.
➡️ A dona de casa Dinaíze Carvalho vestiu uma camiseta branca, pedindo Justiça pela morte da filha, que morreu após ela passar 11 dias internada na Divino Amor neste ano. Ela disse que sofreu violência obstétrica.
“A médica foi super ignorante comigo, falou simplesmente: ‘Sua filha está morta dentro de você’. Foi desumano. Uma mãe. Eu vi aquilo ali, desumano. Depois dessa, me colocaram para tirar a minha filha no parto normal, eu não tinha força nenhuma. A médica me abria, parecia que estava abrindo o frango, gente, vocês não tem noção”.
Depoimentos de mães na Câmara
Reprodução/Inter TV Cabugi
‘Sensacionalismo’: fala de secretário repercute
No meio dos discursos, uma fala do secretário de Saúde de Parnamirim, Rogério Gurgel, no qual ele citou a expressão “sensacionalismo barato”, provocou reações.
A fala em questão foi:
“Nós estamos aqui também para prestar os esclarecimentos, mas não usemos da dor do outro para fazer sensacionalismo barato e gerar sensação de pânico na nossa cidade para que as nossas mamães não possam ir ter os seus ter seus filhos na maternidade, que é uma das melhores maternidades do Brasil, com uns dos melhores profissionais”.
Após a fala, o secretário de Saúde fez uma retratação e disse em entrevista à Inter TV Cabugi nesta terça-feira (1º) que foi mal compreendido.
“Eu fui mal compreendido. É tanto que eu pedi uma retratação. Quando nós falamos em sensacionalismo, jamais é destratando as mães que perderam seus filhos, seus bebês. O sensacionalismo na minha fala era das pessoas que estavam usando as redes sociais para causar um pânico generalizado na nossa cidade”, disse.
O secretário disse que não invalida a dor das mães, mas que a fala foi direcionada a um grupo de pessoas que buscou criar um pânico em relação à qualidade da unidade de saúde.
“A nossa maternidade tem profissionais incríveis, a nossa maternidade é referência, a única maternidade no estado de alto risco, então, invariavelmente, aconteceram casos tristes, e nós temos um comitê, nós temos profissionais que estão lá inclusive para fazer a investigação”, disse.
Ele reforçou a investigação que foi conduzida pela direção da maternidade.
“A investigação está sendo feita, mas repito a todos vocês: quando eu falo em sensacionalismo são das pessoas más que utilizam as suas redes sociais para pegar um apoio e gerar mídia”.
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