Áudios de agente da PF revelam detalhes de plano golpista; veja

O policial federal Wladimir Soares é um dos 34 denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por envolvimento na tentativa de golpe de Estado em 2022Reprodução/redes sociais

A Polícia Federal (PF) encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um conjunto de provas sobre o plano golpista para manter Jair Bolsonaro (PL) no poder após as eleições de 2022. Áudios divulgados nesta quinta-feira (15), revelam a participação ativa do policial Wladimir Matos Soares na tentativa de golpe de Estado e indicam a existência de um grupo armado que estaria, segundo as gravações, preparado para agir com violência, inclusive, para perpetrar o assassinato do presidente eleito, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro do STF, Alexandre de Moraes..

Em um dos áudios, Soares afirma que participava de uma equipe de operações especiais, com grande poder de fogo, preparada para impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

“Nós fazemos parte de uma equipe de operações especiais que estava pronta para defender o presidente [Bolsonaro] armado e com o poder de fogo elevado para empurrar quem viesse à frente. Estávamos prontos”, garantiu.

“A gente ia com muita vontade, íamos empurrar meio mundo de gente, íamos matar meio mundo de gente, não estava nem aí mais”, acrescentou Soares. De acordo com as gravações, o plano era agir para que a posse não ocorresse, mas o grupo não agiu para impedir que Lula assumisse a presidência do Brasil por falta de autorização de Bolsonaro.

“Não ia ter posse, cara. Nós não íamos deixar, mas aconteceu. E Bolsonaro faltou um pulso pra dizer: ‘não tenho general, tenho coronel, então vamos com os coronéis’. Era o que a tropa toda queria”, contou.

Soares ainda detalhou o envolvimento de militares na preparação para o golpe. Em uma das mensagens, ele contou que o Exército estava começando a se mobilizar para “o dia da tomada” e que os acampamentos em frente ao Quartel General (QG) em Brasília seriam desmontados, para dar mais segurança aos integrantes do grupo golpista. 

“O Exército está começando a indicar para a gente a desmobilização da área. Porque na frente dos QGs é onde vai ter confusão se o nosso pessoal continuar acampado ali. Então, o Exército já prevendo esse tipo de coisa que pode vir a acontecer, já está começando a tomar algumas medidas”, assegurou o agente da PF, tranquilizando os outros membros da trama golpista. 

Nessa mesma mensagem, ele alegou que não havia necessidade de os apoiadores do ex-presidente Bolsonaro ficarem acampados até o momento da tomada de poder, isso porque, na sua avaliação, a manifestação já tinha legitimado o plano golpista.

“É porque a manifestação já legitimou, então não tem necessidade de se manterem ali milhares de pessoas até o dia da tomada. Não precisa, porque, se isso acontecer, vai ter muito efeito colateral para o nosso lado, de pessoas que não estão prontas para uma guerra”, opinou. 

“Então, as coisas estão começando, senhores, a se desenhar. O preparo está sendo feito e, com certeza, o pau vai torar. Esse ladrão não vai assumir, não”, finalizou Soares. 

Assassinato de Lula e Moraes

Segundo as investigações, Soares teria atuado infiltrado na equipe de segurança de Lula após sua eleição, repassando informações estratégicas aos conspiradores. A PF apurou que o agente fazia parte de um plano que previa o assassinato do presidente eleito, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro do STF, Alexandre de Moraes.

Em um dos áudios, Soares informou que estava com “Moraes na mira”, o que, para a PF, revela a intenção de assassinar o ministro. O agente também criticou Bolsonaro por ter desistido do plano golpista, o que, segundo ele, foi o que impediu o assassinato do magistrado.

“Tinha que ter cortado a cabeça dele [Moraes], mas não fez, foi frouxo. Tentou fazer tudo direitinho, dentro das quatro linhas e não sei o que, e só se ferrou”, reclamou Soares sobre Bolsonaro. 

Em outros trechos das gravações, o agente falou, explicitamente, sobre prender o magistrado, que, à época, presidia o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “A gente estava preparado para isso, inclusive. Para ir prender o Alexandre Moraes. Eu ia estar na equipe”. 

As mensagens periciadas ainda mostram que Soares forneceu detalhes sensíveis sobre as rotas e vulnerabilidades de segurança de Lula. Em depoimento, no final de 2024, o agente já tinha confirmado que teria sido “cooptado” para integrar a equipe do presidente eleito e colaborar com as informações. 

As gravações também revelam que o grupo planejava ações coordenadas com apoio de setores das Forças Armadas. Soares afirma que o almirante Almir Garnier, então comandante da Marinha, apoiava o plano de golpe. “Garnier foi o único. A Marinha desde o começo foi a única que apoiou 100%. O resto tirou o corpo”, detalhou.

Segundo Soares, o plano foi frustrado porque Bolsonaro “deu para trás”: “Esperávamos só o ok do presidente, uma canetada para a gente agir. Só que o presidente foi traído dentro do Exército. Os generais disseram que não iam mais apoiar ele”. 

Após a posse de Lula, Soares ainda revelou, por meio dos áudios, ter se arrependido do plano golpista. “Minha vontade era chorar. Estômago embrulhado”, disse.

Defesa minimizou informações

Em março deste ano, a defesa do policial Waldimir Soares enviou uma manifestação ao STF minimizando as afirmações do agente sobre a trama golpista. Os advogados alegaram que o réu teria feito uma “bravata despretensiosa” ao dizer que estaria “pronto” para defender o Palácio do Planalto caso Bolsonaro decidisse não deixar a presidência após as eleições de 2022.  

Em um dos áudios, Soares garantiu que estava preparado para agir e só precisava de uma “canetada” de Bolsonaro para entrar em ação. Para a defesa, essa alegação é uma “hipótese esdrúxula”, que seria “inexequível, na prática”. Os advogados ainda argumentaram que seria um “contrassenso” achar que um agente da PF seria capaz de garantir a segurança do Planalto. 

Sobre ter se infiltrado na segurança de Lula, a defesa disse que essa narrativa é “totalmente desprovida de verdade”. 

Entenda o caso

O policial federal Wladimir Soares é um dos 34 denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por envolvimento na tentativa de golpe de Estado em 2022. Preso preventivamente desde novembro de 2024, ele é apontado como integrante do chamado “núcleo 3” da organização criminosa denunciada ao STF, acusada de planejar ações violentas para abolir o Estado Democrático de Direito e impedir a posse de Lula.

O conteúdo divulgado nesta quinta-feira (15) foi extraído de seus aparelhos eletrônicos, apreendidos na ocasião da prisão, e inclui áudios e mensagens que reforçam sua vinculação direta com os planos de captura de autoridades. 

Os diálogos se estenderam entre dezembro de 2022 e janeiro de 2023 e indicam articulações com outros agentes públicos e civis. As investigações revelaram ainda trocas de mensagens com a intenção de elaborar ações radicais contra as instituições democráticas, incluindo a dissolução do STF. 

Essas provas são consideradas novas no processo, por não estarem reunidas nos autos já anexados à ação em curso no Supremo. O conteúdo foi recebido pela Corte e encaminhado, nesta quinta-feira, pelo relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, às defesas dos acusados, para análise e garantia do direito ao contraditório. 

Conforme a legislação vigente, essas novas informações só poderão ser consideradas no julgamento se os advogados tiverem tido acesso prévio e oportunidade de apresentar manifestação formal sobre elas.

Na denúncia da PGR, o grupo ao qual Soares pertencia é acusado dos crimes de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. 

Apesar das evidências, a defesa de Wladimir já se manifestou nos autos e o agente prestou depoimento no curso das investigações. O caso segue em análise no Supremo, dentro do conjunto de ações que apuram as articulações criminosas em torno da tentativa de impedir a posse e o exercício do mandato presidencial eleito em 2022.

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