‘Vida’ no planeta K2-18 b: descoberta empolga, mas especialista aponta que ainda faltam peças no quebra-cabeça


Especialista destaca que o James Webb é o melhor instrumento atual para conseguirmos uma detecção firme de que há vida fora da Terra, mas alertou que é preciso ter cautela com anúncio. Cientistas questionam indícios de ‘vida’ em outro planeta
Ainda que a detecção de gases no planeta K2-18 b seja um dos sinais mais fortes de vida além do nosso sistema solar até hoje, os cientistas pedem cautela com a descoberta.
➡️Na quarta-feira (16), um grupo de pesquisadores da Universidade de Cambrige anunciou a detecção, com a ajuda do telescópio James Webb, da impressão química de gases na atmosfera de um planeta que fica a mais de 100 anos luz da Terra.
Na Terra, os dois gases presentes na atmosfera desse planeta distante – o dimetil sulfeto (DMS) e o dissulfeto de dimetila (DMDS) – são gerados apenas por organismos vivos. Mas, isso não significa que o mesmo acontece no K2-18 b.
Ilustração do planeta K2-18b, um mundo distante que pode abrigar vida.
Divulgação
O astrônomo do Centro Universitário FEI, Cássio Barbosa, explica que a descoberta é mais uma peça de um quebra-cabeça que segue uma linha evolutiva, mas que não necessariamente indica a presença de vida extraterrestre.
De acordo com Barbosa, os gases detectados também podem ser gerados por processos geológicos, como vulcanismo, além dos biológicos.
Durante o anúncio da descoberta, um dos principais autores do estudo, o astrônomo Nikku Madhusudhan, afirmou que ainda são necessários mais estudos teóricos e experimentais para garantir se não há um mecanismo abiótico (sem envolver vida) que possa produzir DMS ou DMDS em uma atmosfera como a do K2-18 b.
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Além disso, Cássio também argumenta que, no estudo, é considerado um cenário em que há oceanos com hidrogênio, algo que favoreceria os processos biológicos para a formação dessas moléculas – e que ainda não pode ser provado.
“A criação dessas duas moléculas tem passos intermediários que deveriam ter aparecido e não aparecem. O ácido sulfídrico, por exemplo, deveria ser detectado na atmosfera em quantidades até maiores do que a dos gases, e isso não aparece”, analisa.
Para chegar à conclusão de que os gases teriam origem biológica, os cientistas precisam modelar toda a atmosfera do planeta, o que é algo muito complicado de ser feito, ainda mais em um planeta a mais de cem anos luz da Terra.
“Nós não conseguimos fazer (modelagem da atmosfera) com 100% de certeza para Vênus, que está aqui do lado. Temos também aí o fato de que esse planeta é maior do que a Terra e menor do que Netuno. Está mais para ser um mini Netuno do que super Terra e inclusive um mini Netuno coberto por lava, o que daria a chance zero de ser uma origem biológica para essa detecção”.
Apesar das ressalvas, o astrônomo reconhece que, com a ajuda do James Webb, torna-se cada vez mais próxima a detecção firme de que há vida fora da Terra.
“Com o James Webb, com dados muito bons e precisas, com técnica melhores, que vão sendo aprimoradas, é uma questão de pouco tempo que a gente consiga ter uma detecção firme [de vida fora de Terra] como essa”, afirma Cassio.
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Outras descobertas anteriores relevantes
Barbosa comparou a descoberta atual com outra de 2020. Na época, foi identificado um gás (fosfina) na atmosfera de Vênus, o que poderia indicar vida extraterrestre microbiana. Mas os autores foram mais “cautelosos”, informando que poderia se tratar de algo com origem geológica.
Na década de 1970, duas missões que pousaram em Marte levaram a uma estação meteorológica vários instrumentos e inclusive um laboratório de bioquímica.
Nos experimentos realizados, fora, observadas evidências do consumo de oxigênio e produção de gás carbônico, o que indicaria vida, assim como evidências de que aquilo poderia ter origem química.
Desde os anos 1990, cerca de 5.800 exoplanetas (planetas fora do nosso sistema solar) foram descobertos. Cientistas têm criado hipóteses sobre a existência dos chamados mundos hycean – cobertos por oceanos de água líquida habitáveis por microrganismos, com atmosfera rica em hidrogênio.
Observações anteriores do Webb, que foi lançado em 2021 e entrou em operação em 2022, já haviam identificado metano e dióxido de carbono na atmosfera de K2-18 b – a primeira vez que moléculas baseadas em carbono foram detectadas na atmosfera de um exoplaneta na zona habitável de uma estrela.
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