
Ao menos 70,1% dos habitantes da metrópole vivem em ruas sem rampas para cadeirantes, segundo IBGE. Além disso, cerca de 52% relatam presença de impedimentos nas calçadas. Censo 2022 revela falta de acessibilidade em ruas de Campinas
Ao menos 70,1% dos habitantes de Campinas (SP) vivem em ruas sem rampas para cadeirantes e cerca de 52% relatam a presença de obstáculos nas calçadas, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Os dados divulgados nesta quinta-feira (17) fazem parte da pesquisa Características Urbanísticas do Entorno dos Domicílios, que tem como base o Censo Demográfico de 2022 e analisa condições de infraestrutura urbana, como iluminação, pavimentação e acessibilidade.
O IBGE coletou respostas de 422.143 domicílios. A pesquisa também mostra que:
97% moram em vias sem sinalização para bicicletas;
81,1% relatam a falta de pontos de ônibus ou vans.
O g1 consultou um arquiteto e urbanista que citou problemas de acessibilidade na metrópole, como calçadas irregulares, rampas mal executadas, iluminação inadequada, obstáculos nas calçadas e questões no transporte público e na infraestrutura cicloviária.
“Campinas não é considerada uma cidade acessível, no meu ponto de vista. É muito ruim, principalmente o Centro da cidade, calçadas estreitas, fora do padrão da acessibilidade, pavimentação toda estragada, esburacada”, analisa João Verde, professor aposentado da PUC-Campinas e presidente da Associação Regional de Escritórios de Arquitetura (AREA).
Os pontos levantados pelo especialista se confirmaram nas ruas. Em entrevistas à reportagem, moradores da cidade relataram dificuldades para locomoção na cidade, em especial aqueles que têm mobilidade reduzida. Leia mais abaixo.
Homem desvia de poste no meio da calçada no Centro de Campinas
Estevão Mamédio/g1
Acessibilidade
O levantamento do IBGE mostra que, em Campinas, apenas 21,8% dos domicílios ficam em vias onde existem rampas de acesso para pessoas que usam cadeiras de rodas. A presença desse equipamento é essencial para garantir acessibilidade e mobilidade urbana segura.
♿ Entenda: conhecida como Lei da Acessibilidade, a Lei nº 10.098 estabelece que o planejamento e a urbanização das vias públicas devem ser feitas para atender a todas as pessoas, inclusive aquelas com deficiência ou mobilidade reduzida.
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Essa foi também a primeira vez que o IBGE coletou informações sobre a qualidade das calçadas no país. Na metrópole, a pesquisa apurou que somente 39,9% dos domicílios visitados estão em vias cujo passeio público não possui impedimentos estruturais.
Como obstáculos foram considerados elementos permanentes que restringem a passagem em menos de 80 centímetros, como vegetação, mobiliário urbano, buracos, desníveis, calçadas quebradas e entradas irregulares para estacionamento.
“Impedimento é o que mais tem. Calçadas estreitas, mal pavimentadas, esburacadas, muito altas, às vezes um poste colocado no meio da calçada, mal dá condições de um pedestre passar pela calçada. Às vezes a pessoa tem que sair da calçada, pisar na rua e voltar para a calçada para continuar, porque ou o poste, ou a árvore ocupam a calçada inteira”, destaca Verde.
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De acordo com o IBGE, a presença de obstáculos pode representar um risco à circulação de pedestres, especialmente para idosos, pessoas com deficiência, gestantes e crianças, comprometendo a acessibilidade e aumentando as chances de acidentes.
A ausência de calçada ou passeio foi informada em 33 mil domicílios – 7,8% do total. O instituto ressalta que presença de calçadas é importante para garantir mais segurança e conforto aos pedestres, além de contribuir para um espaço urbano mais inclusivo e acessível.
Eduardo Domingos Soares usa uma bengala durante as caminhadas e diz que andar nas ruas de Campinas é “complicado”. “Tem lugar que dá para andar, e tem lugar que é uma dificuldade para passar. Já vi pessoas vindo atrás de mim, que usam bengala também, e chegaram a cair”, conta.
Quem também sente os impactos da falta de acessibilidade é Wagner Tesserolli. Cadeirante, o morador afirma que as calçadas quebradas já causaram danos aos pneus da cadeira, e que uma das maiores dificuldades está no acesso às calçadas.
“Tem lugar que não tem acesso então você tem que dar uma volta tremenda. Deveria ter rampa, né. Tem lugar que tem, tem lugar que não, e tem lugar que é mal feita. Você enrosca quando vai passar”, relata.
Wagner Tesserolli, cadeirante, relatou dificuldades relacionadas à acessibilidade em Campinas
Estevão Mamédio/g1
Mobilidade urbana
De forma inédita, no Censo de 2022, a estrutura viária para veículos foi retratada através do quesito de capacidade máxima de circulação da via.
A pesquisa detalha que 97,05% dos moradores apontaram a ausência de sinalização para bicicletas nas vias em que moram.
Outros 81,1% relataram a inexistência de pontos de ônibus ou van. Além disso, em 94,4% dos domicílios a via tinha capacidade para circulação de caminhões ou ônibus.
O arquiteto e urbanista consultado pelo g1 também destacou a importância do transporte público para a mobilidade urbana. Segundo ele, é essencial oferecer ônibus em boas condições, com manutenção adequada, plataforma baixa, rampas de acessibilidade, ar-condicionado e motoristas capacitados.
“Isso é essencial na questão do acolhimento e também com relação a você propiciar uma cidade com melhor qualidade de vida. Se você tem um transporte público de qualidade, as pessoas vão passar a deixar os carros em casa e usar o transporte público, principalmente para suas atividades principais do dia a dia, ir ao trabalho, ir a pequenas compras, ir à escola, universidade”, destaca João Verde.
Infraestrutura urbana e arborização
A maioria da população questionada apontou a existência de equipamentos de infraestrutura. A iluminação pública e a pavimentação das vias foi relatada por, respectivamente, 97,3% e 92,3% dos domicílios. Outros 71,5% disseram contar com bueiro ou boca de lobo, enquanto 49,9% afirmaram morar em locais com cinco ou mais árvores.
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O que dizem a Emdec e a Prefeitura?
“A Prefeitura de Campinas instituiu o Plano Municipal de Rotas Acessíveis, formalizado pelo Decreto nº 22.391, de 21 de setembro de 2022, elaborado por um comitê intersetorial com a participação de 13 secretarias municipais.
O plano foi aprovado de forma unânime pelo Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência e norteia as ações de diversas secretarias, incluindo:
Reforma e adequação de calçadas e passeios públicos, especialmente nos principais corredores de serviço e áreas de intenso fluxo de pedestres;
Execução de guias rebaixadas, travessias elevadas e instalação de sinalização tátil e sonora em cruzamentos estratégicos e pontos de transporte público;
Vistorias técnicas e emissão de pareceres do Setor de Acessibilidade Arquitetônica (SAA) para obras de reforma e construção em imóveis públicos e de uso coletivo, com vistas à conformidade com as normas de acessibilidade.
Vale destacar que, embora as melhorias ainda não tenham alcançado a totalidade do território municipal, as intervenções priorizaram as regiões de maior vulnerabilidade social e concentração de serviços públicos, conforme determina o próprio plano.
No caso das rampas, elas também são implantadas a partir de pedidos da própria população, que envia através dos canais oficiais de comunicação; de pedidos de associações e representantes de bairro, de ONGs e ainda de indicações feitas por vereadores. Os pedidos são analisados pela área técnica e, havendo viabilidade, atendidos.
De 2022 a fevereiro de 2025, foram implantadas 1.137 rampas de acessibilidade em Campinas.
Ressaltamos ainda que todas as obras da Prefeitura de Campinas são entregues com acessibilidade, incluindo rampas, como terminais de ônibus, pavimentação (como as do Meu Bairro Bem Melhor 2) e edificações como Centros de Saúde e escolas.
Em relação às calçadas: a construção, manutenção e a limpeza de calçadas particulares são de responsabilidade do proprietário, seja da residência, comércio ou terreno em frente, conforme a Lei Complementar 09, de dezembro de 2003.
A Coordenadoria de Fiscalização de Vielas e Terrenos (Cofivt), da Secretaria de Serviços Públicos, faz vistorias nas calçadas por meio de demandas dos cidadãos e das próprias equipes de campo. Se houver demanda para rampa de acessibilidade, a Cofivt envia para a Emdec, responsável pela construção de rampas. Se a demanda for relacionada à obstrução da calçada, como vasos de plantas ou piso que dificulte a mobilidade, a situação é encaminhada para avaliação do Departamento de Acessibilidade da Secretaria de Desenvolvimento e Assistência Social. Após avaliação, a Cofivt pode notificar o proprietário a tomar as providências para desobstruir a passagem ou melhorar as condições do pavimento da calçada. Se for a lixeira do proprietário da calçada, primeiro ele é orientado a reinstalar em ponto da calçada que permita a passagem. Se não fizer, pode ser notificado e multado. Para outros obstáculos em geral, a Cofivt notifica o proprietário para que tome as providências. Caso não faça, é multado. A multa não isenta o responsável de fazer os ajustes necessários.
Em relação à acessibilidade da frota de ônibus, quase 100% dos ônibus, hoje, já possui elevadores. E o edital da licitação em andamento prevê 100% da frota acessível.
No caso das rotas cicloviárias (ciclovias, ciclorrotas, ciclofaixas e calçadas compartilhadas), a cidade tem atualmente 120,68 km de rotas, sendo 45,61 km implantadas desde 2022. Em andamento, são 17,28 km (Mercedes Benz – Terminal Ouro Verde – 8,5 km; Parque Via Norte – 3,13 km e Parque Ecológico “Hermógenes de Freitas Leitão” – Barão do Café/Mata Santa Genebra – 4,8 km.
A Emdec implantou ainda abrigos de ônibus padronizados segundo a seguinte distribuição:
2022: 347 padrão “Glicério”/ 67 metálicos.
2023: 347 padrão “Glicério” / 167 metálicos.
2024: 73 padrão “Glicério”/ 82 metálicos.
Abrigos Amigo | Entre 2023 e 2024: 13 Abrigos Amigos
Abrigos “Andorinha”: 472 – de 2021 a 2024.”
*Estagiárias sob supervisão.
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