Pesquisadores universitários dos EUA temem futuro sob Trump

(Arquivo) Universidade Johns Hopkins perdeu fundos federais de 800 milhões de dólares sob nova administração de TrumpRob Carr

Rob Carr

Universidades ameaçadas com cortes de fundos federais, programas de pesquisas à beira do fechamento, professores e corpo docente passíveis de serem presos e deportados por suas opiniões políticas: a educação superior americana está submetida a uma forte pressão pelo governo de Donald Trump.

Ante a possibilidade de perder 400 milhões de dólares (2,3 bilhões de reais) em subsídios federais, a Universidade de Columbia de Nova York cedeu às mudanças exigidas por Trump, que havia acusado a instituição da Ivy League de tolerar o antissemitismo por permitir manifestações pró-palestinas em seu campus.

Outra importante instituição, a universidade Johns Hopkins, em Baltimore, viu evaporar 800 milhões de dólares (4,6 bilhões de reais) em fundos eleitorais, o que a levou a anunciar mais de 2.000 demissões.

Milhares de pesquisadores que contribuem para alguns dos maiores avanços médicos e científicos do mundo tentam reduzir danos, ou se preparam para sua demissão.

A coerção da administração Trump “faz parte de uma estratégia autoritária clara destinada a esmagar a liberdade acadêmica e a pesquisa crítica na educação superior americana”, declarou Todd Wolfson, presidente da Associação Americana de Professores Universitários (AAUP, em sua sigla em inglês).

As “exigências sem precedentes de Trump e as ameaças de ações similares contra 60 universidades geraram instabilidade e um profundo efeito paralisante nos campi universitários de todo o país”, alertou a AAUP essa semana.

A volta do republicano ao poder trouxe com ele decisões impactantes, como a proibição repentina do ensino de algumas disciplinas, o congelamento de bilhões de dólares em fundos de pesquisa e, até mesmo, a demissão de docentes por suas opiniões políticas.

“Há um medo e uma incerteza latentes”, declarou à AFP uma pesquisadora em astronomia de Boulder, Colorado, sob condição de anonimato. “Qualquer coisa pode acontecer a qualquer momento”.

– Clima de medo –

Quando um cientista francês foi proibido de entrar nos Estados Unidos devido à sua opinião sobre as políticas de pesquisa da administração Trump (obtida após uma revista em seu telefone, segundo informou seu governo), a preocupação aumentou ainda mais.

Washington nega que essa foi a razão pela qual o docente europeu não pôde entrar no país.

O clima de medo continuou a aumentar após a recente prisão para posterior deportação (suspensa depois por um juiz) de um pesquisador de pós-doutorado indiano da Universidade de Georgetown por seus supostos vínculos com o grupo palestino Hamas.

A universidade, com sede em Washington, afirmou que apoia o direito ao debate aberto no campus, “mesmo que as ideias subjacentes sejam difíceis, controversas ou questionáveis”.

Os pesquisadores alertam que o próprio vocabulário que utilizam em seu trabalho, desde “diversidade” até “vacinas” e “clima”, põe em risco financiamentos por parte do governo.

Se a ciência for regulada “por pessoas distantes da ciência, deixa de ser ciência e se torna política”, declarou à AFP um cientista com 30 anos de experiência em pesquisa biomédica.

A força do sistema de ensino superior americano reside em sua capacidade de “criar e transferir conhecimento e participar da pesquisa” e de inovar em prol do bem público, afirmou Lynn Pasquerella, presidente da Associação Americana de Colégios e Universidades (AACU, em sua sigla em inglês).

Mas conseguir esses objetivos “pressupõe a livre troca de ideias” e a autonomia das instituições educacionais.

– Perfil discreto –

Diversos pesquisadores “escolhem ter um perfil discreto”, o que destaca a atmosfera de medo reinante, disse a pesquisadora do Colorado.

“Mesmo que você seja como eu, uma cidadã americana (…), você se pergunta se ainda tem liberdade de expressão e se sofreria consequências por protestar contra a política de Trump”.

Para um estudante de genética, que não quis se identificar, o silêncio de sua instituição escolar localizada no leste dos EUA sobre esses temas é muito preocupante. “Não se falou disso nem se mostrou transparência, apesar de a universidade parecer estar em chamas”, disse.

Diversos pesquisadores se negam, por sua vez, a admitir que algo assim está acontecendo em um país que há muito tempo se considera academicamente estável e acolhedor.

Alguns se perguntam sobre seu futuro profissional nos Estados Unidos.

A pesquisadora em astronomia lembrou ter lido publicações nas redes sociais de colegas que escreviam coisas como: “Preciso de informações sobre como obter um visto para a Espanha”. E ela mesma não descarta explorar oportunidades de trabalho no exterior.

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