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
Do pomar à mesa, a produção do fruto cresce e impulsiona o turismo e os negócios no Planalto Norte – Foto: Divulgação
A paisagem do Planalto Norte Catarinense ganhou novos tons nos últimos anos. Pequenas propriedades familiares têm apostado na produção de mirtilo, transformando a região em um polo promissor para a fruticultura e o turismo rural.
No município de Campo Alegre, a colheita da fruta azul-púrpura não apenas gera renda, mas também fortalece o vínculo entre o campo e a cidade, criando novas oportunidades para empreendedores locais.
A cultura do mirtilo no Brasil é relativamente nova. Introduzida pela Embrapa na década de 1980, chegou a Santa Catarina nos anos 90 e, em 2017, começou a ganhar espaço como uma alternativa viável para a diversificação agrícola na região.
O solo naturalmente ácido do Planalto Norte favorece o cultivo, minimizando a necessidade de correções. Além disso, o mirtilo se destaca pelo seu alto valor de mercado.
Segundo Vitor Lehmkuhl, engenheiro agrônomo da Epagri, o mirtilo possui grande potencial de valorização no mercado, tornando-se uma alternativa promissora para as pequenas propriedades de Santa Catarina, onde predomina a agricultura familiar. Ele explica que, por oferecer alta rentabilidade em áreas reduzidas, a cultura se mostra uma solução viável para esses produtores.
Colheita de oportunidades
Os benefícios nutricionais e antioxidantes fazem do mirtilo um dos alimentos mais valorizados no mercado, mas a produção exige dedicação. A colheita, feita manualmente, requer atenção e paciência, pois cada frutinha é retirada uma a uma.
O envolvimento familiar na produção é um dos pilares da agricultura local. No Sítio Olho d’Água, da Família Briske, a pequena Helena, de nove anos, já participa da colheita e admite que não resiste ao sabor da fruta. A fruticultora Alice Briske compartilha o orgulho pelo trabalho no campo e pela continuidade do legado familiar.
“Eu fico muito realizada porque aqui tem histórias lindas do meu pai. Aqui na área dos mirtilos, meu pai plantava milho, feijão, e a gente ajudava ele. Hoje em dia eu fico super feliz, porque parece que o meu pai e a minha mãe estão aqui, presentes com a gente. E agora o meu filho continuando esse legado é muito importante.” – comenta.
A história de Rafael Briske exemplifica a importância da agricultura familiar. Antes técnico de TI, ele decidiu investir na terra herdada e encontrou no mirtilo uma alternativa sustentável. Até quatro anos atrás, o fruticultor sequer conhecia o mirtilo, mas encontrou na fruta uma oportunidade promissora para transformar sua propriedade.”
Diante da necessidade de tornar o sítio rentável, a família começou a buscar alternativas, mas enfrentou desafios, já que o cultivo exigia investimento, irrigação e boas condições de solo e localização.
Com o tempo, ele e a esposa passaram a se dedicar exclusivamente à propriedade, expandindo as atividades para além da fruticultura. O que começou como uma renda extra logo se revelou uma oportunidade de sustento para a família.
Do campo para a mesa: turismo e gastronomia
O aumento da produção abriu espaço para novos negócios na região, tornando o mirtilo um ingrediente cada vez mais presente. Restaurantes e empreendimentos locais passaram a incluir a fruta em receitas inovadoras, promovendo uma conexão entre produtores e consumidores.
Rafael Briske, diante do desafio de escoar sua produção, buscou alternativas para agregar valor à fruta. Há dois anos, com um estoque acumulado de mirtilos e pouca demanda, decidiu procurar Fernando Veronese, proprietário de uma cervejaria rural em Campo Alegre, e propôs que criassem algo novo a partir do fruto.
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O mirtilo possui grande potencial de valorização no mercado, tornando-se uma alternativa promissora para as pequenas propriedades de Santa Catarina- Foto: Divulgação
Fernando, que já trabalhava com ingredientes locais, aceitou o desafio e começou a pesquisar formas de incorporar o mirtilo à produção de cerveja. Ele testou combinações que destacassem o sabor da fruta, incluindo malte tostado, que adiciona notas sutis de café e chocolate à bebida. O resultado foi um chope especial, onde os aromas e o sabor do mirtilo se destacam de maneira equilibrada.
Desde então, a parceria se fortaleceu, e a inclusão do mirtilo no cardápio da cervejaria ampliou a visibilidade da fruta – mostrando seu potencial não apenas na produção in natura, mas também como ingrediente na gastronomia e na criação de novos produtos na região.
Inovação e novas oportunidades
Além de impulsionar a economia local, a produção de mirtilo tem passado por inovações que ampliam suas possibilidades no mercado. Uma nova variedade, desenvolvida recentemente por equipes de pesquisa brasileiras, foi adaptada para o clima tropical, permitindo que a fruta se desenvolva com menos horas de frio.
O empreendedor Márcio Habeach, explica que a inovação tem sido fundamental para expandir o cultivo para diferentes regiões do país. Tradicionalmente, o mirtilo precisa de um período de frio intenso no outono e inverno para se desenvolver, mas essa nova cultivar consegue crescer mesmo em locais de clima mais quente. Segundo ele, a novidade já está se espalhando pelo Brasil e permite que a fruta seja colhida ao longo do ano.
Ao ser questionado se seria possível cultivar mirtilos em regiões como Florianópolis e até no litoral, Márcio confirma que sim, desde que alguns cuidados específicos sejam seguidos. Para ele, com uma boa hidratação, nutrição equilibrada e podas adequadas, a fruta pode ser cultivada praticamente em qualquer lugar do Brasil, garantindo que produtores de diversas regiões tenham acesso a essa nova oportunidade.
Na Bio Cult, essa inovação tem sido vista como uma estratégia para oferecer mirtilo fresco o ano todo. Além da produção in natura, a família investe na criação de novos produtos e na parceria com outros empreendedores da região, agregando valor à fruta e impulsionando o turismo rural.
Inclusive, a propriedade não se limita ao cultivo: oferece experiências como a colheita aberta ao público, hospedagem em chalés e produção artesanal de geleias e sobremesas. A diversidade de produtos e experiências reforça o potencial econômico da fruta e fortalece a rede de produtores locais.
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A diversidade de produtos e experiências reforça o potencial econômico da fruta – Foto: Divulgação
O cuidado no pós-colheita também faz parte do processo, garantindo que a fruta seja colhida e embalada no mesmo dia para manter a qualidade. Segundo Márcio, ela pode ser armazenada na geladeira por até seis dias, preservando seu sabor e benefícios.
Com tanto potencial, o mirtilo continua atraindo produtores e consumidores, fortalecendo uma rede de oportunidades que conecta o campo, o turismo e a gastronomia. O Planalto Norte Catarinense se consolida como um polo das frutas vermelhas, impulsionando a economia e promovendo novas experiências.
Para saber mais sobre a produção de mirtilo em Santa Catarina, assista na íntegra ao episódio do programa Agro, Saúde e Cooperação. O projeto, desenvolvido pelo Grupo ND, tem parceria com a Ocesc, Aurora, SindArroz Santa Catarina e Sicoob.