Igor Peretto foi assassinado aos 27 anos, dentro do apartamento da irmã, em Praia Grande (SP). Três pessoas próximas à vítima foram presas: Rafaela Costa (viúva), Marcelly Peretto (irmã) e Mario Vitorino (cunhado e sócio). Marcelly Peretto (à esq.), Igor Peretto (centro) e Mario Vitorino (à dir.)
Yasmin Braga/TV Tribuna, Redes Sociais e Reprodução
As defesas de Marcelly Peretto e Mario Vitorino, acusados de participação no assassinato de Igor Peretto, alegam que o advogado Felipe Pires de Campos cometeu tergiversação. Trata-se de um crime em que um profissional da área defende, simultaneamente ou sucessivamente, clientes em conflito na mesma causa. Neste caso, Campos teria defendido a acusada antes de representar o restante da família da vítima.
O comerciante Igor Peretto foi encontrado morto no apartamento de Marcelly Peretto, irmã dele, em Praia Grande, no litoral de São Paulo. Além dela, Rafaela Costa (viúva) e Mário Vitorino (cunhado) também foram presos.
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Segundo o advogado Leandro Weissmann, atual representante de Marcelly, o colega Felipe Pires de Campos chegou a orientar a cliente em um primeiro momento. O profissional, porém, passou a ser assistente de acusação. “Fato ao qual será apurado eticamente e quiçá, na esfera criminal, pela tergiversação”, declarou o defensor da acusada.
“Aliás, é prova nula e não pode sequer constar dos autos a troca de mensagens entre a acusada Marcelly e seu ex-advogado, referido Dr. Felipe. A conversa entre cliente e advogado é abarcada pelo sigilo profissional”, complementou Weissmann.
A situação também foi alvo de reclamações do advogado Mario Badures, representante de Mario Vitorino. No documento em que apresentou a defesa do cliente, ele afirmou que o assistente de acusação mudou para o lado oposto.
“A postura supracitada nunca, jamais e em tempo algum poderia ter ocorrido, diante da clara existência indicadora, em tese, de prática criminosa”, complementou Badures.
Para ele, a postura de Felipe Pires de Campos não apenas resultou na obtenção de dados para utilização na persecução penal contra Marcelly, mas também em desfavor de Mario, citado em diversas oportunidades no depoimento da mulher.
Procurado pelo g1, o assistente de acusação Felipe Pires de Campos afirmou que repudia veemente as alegações apresentadas, considerando-as infundadas e levianas. Ele alegou que adotará as medidas cabíveis para responder às acusações “desprovidas de fundamento”.
“Desde o início, temos atuado exclusivamente em defesa dos interesses da família da vítima, sempre com o objetivo de buscar a verdade e a justiça. Ressaltamos que a irmã da vítima foi conduzida à Delegacia a pedido da própria família e por iniciativa dela, que também se identificava como vítima do réu, Mário. Em suas declarações, relatou os fatos tanto a nós quanto aos familiares”, disse Campos.
Ainda de acordo com ele, após a apresentação espontânea de Marcelly à autoridade policial, surgiram indícios que levaram à possibilidade de investigação sobre a conduta dela. “Nesse contexto, ela optou por constituir advogado para sua defesa, considerando que nossa atuação sempre esteve direcionada exclusivamente à proteção da vítima”.
Ao g1, Weissmann afirmou que Marcelly sente que foi induzida a erro. “Eticamente há impedimento de um advogado atuar a favor e depois contra, no mesmo caso. Além disso, ela não tem certeza, mas acredita que referido profissional atua em favor da empresa onde seu ex-marido é sócio e, também nesse processo atua contra o mesmo”.
Procurado, o advogado Mario Badures não se posicionou novamente até a última atualização desta reportagem.
O que é tergiversação? ⚖️
É um crime que ocorre quando um advogado, procurador judicial ou sociedade de advogados defende, simultaneamente ou sucessivamente, clientes com interesses opostos. A tergiversação é conhecida como patrocínio simultâneo, mas também há uma infração chamada de patrocínio infiel.
O advogado Fabrício Posocco, que não tem envolvimento com o caso, explicou ao g1 que o crime de patrocínio infiel está descrito no artigo 355 do Código Penal e significa, como conduta criminosa, a traição do dever profissional por advogado que, ao invés de proteger, prejudica a parte que o contratou.
“Em outras palavras, o cara [advogado] ‘pisa na bola’ [erra] quando está fazendo a defesa da parte e, ao invés de ajudar, está prejudicando”, disse.
Já o patrocínio simultâneo, também previsto no artigo 355, porém em parágrafo único, “também é uma espécie de traição, aquela praticada pelo advogado que aceita defender, na mesma causa, as partes que estejam em conflito, faltando com seu dever profissional”, segundo Posocco.
“A pena prevista para os dois crimes é de detenção de seis meses a três anos de reclusão e multa”, afirmou ele.
Posocco destacou a importância da avaliação do momento em que o crime teria ocorrido. “Uma coisa é ele defender a ideia da família o tempo inteiro, outra coisa ele defendeu a irmã e depois passou para o lado da acusação lá na frente”, complementou.
Segundo ele, é importante que a situação seja avaliada para que o advogado não seja imputado de um crime que não cometeu. “No final das contas, isso pode acabar prejudicando o advogado tanto no que diz respeito ao cometimento de eventual crime, quanto até na própria ordem dos advogados por infração ética”, finalizou.
Últimas palavras
Cronologia da morte do comerciante Igor Peretto: tudo que se sabe da descoberta da traição à morte
Reprodução
De acordo com as testemunhas, Igor declarou amor pela esposa, Rafaela Costa, minutos antes de ser morto a facadas no apartamento da irmã em Praia Grande. As últimas palavras constam em um inquérito da corporação e em uma denúncia do MP-SP.
“Vocês sabem o quanto eu amo aquela mulher, [o] quanto sou louco por ela”, disse Igor, de acordo com uma testemunha. “Vocês tudo contra mim, tudo armando contra mim. Eu era o único que não sabia de nada”.
Segundo a denúncia do MP-SP, Igor também demonstrou estar decepcionado com a irmã e o cunhado. “Do que adiantou eu fazer tudo? Eu me esforço tanto, eu fiz isso sempre por todos, seus traíras, p***”, teria dito a vítima antes de ser morta a facadas.
Triângulo amoroso
Casais (Mário e Marcelly, à esq. e Igor e Rafaela, à dir.) moravam próximos em Praia Grande (SP)
Redes Sociais
O MP-SP concluiu que o trio premeditou o crime porque Igor era um “empecilho no triângulo amoroso” entre Rafaela, Marcelly e Mario Vitorino. Ao g1, a promotora Roberta afirmou ter considerado o caso como “chocante e violento”.
A promotora disse que em nenhum momento os envolvidos tentaram salvar Igor ou minimizar o sofrimento dele. “Fizeram buscas de rota de fuga ou de quanto tempo demoraria para [o corpo] cheirar e chamar a atenção de alguém e eles terem tempo de fugir”, complementou.
Vantagem financeira
Igor Peretto, irmão do vereador de São Vicente (SP), Tiago Peretto (União Brasil), foi morto a facadas em Praia Grande
Reprodução/Redes Sociais e Thais Rozo/g1
De acordo com a denúncia recebida pela Justiça, a morte de Igor traria “vantagem financeira” aos acusados. Os advogados dos presos negaram a versão apresentada pelo MP-SP, que afirmou que Rafaela mantinha relacionamentos extraconjugais com Mário e Marcelly, estabelecendo uma relação íntima entre o trio sem o conhecimento do comerciante.
O Ministério Público citou quais seriam as vantagens financeiras aos denunciados. Segundo o órgão, Mário poderia assumir a liderança da loja de motos que tinha em sociedade com o cunhado, enquanto a viúva receberia herança. “Marcelly, que se relacionava com os dois beneficiários diretos, igualmente teria os benefícios financeiros”.
O MP considerou a ação do trio contra Igor um “plano mortal”. O documento diz que eles planejaram o crime, sendo que Mário desferiu as facadas, a viúva atraiu o comerciante e, junto com Marcelly, incentivou Mário a matá-lo.
O órgão levou em conta essas informações para elaborar a denúncia por homicídio qualificado. “O crime foi cometido por motivo torpe, pois Mário, Rafaela e Marcelly consideraram Igor um empecilho para os relacionamentos íntimos e sexuais que os três denunciados mantinham entre eles.
Ainda segundo a denúncia, o assassinato também foi praticado mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, pois Igor estava desarmado e foi atacado por uma pessoa com quem tinha relacionamento próximo e de quem não esperava mal.
Sobre o crime
Casais estavam dentro do apartamento onde Igor Peretto foi encontrado morto em Praia Grande (SP)
Yasmin Braga/g1 e Reprodução/Redes Sociais
O crime aconteceu em 31 de agosto no apartamento da irmã de Igor, em Praia Grande. Dentro do imóvel estavam a vítima, Marcelly e Mário Vitorino. Rafaela chegou com Marcelly ao apartamento, mas o deixou 13 segundos antes do marido chegar com o suspeito pelo assassinato.
De acordo com os depoimentos do trio e dos advogados, a viúva Rafaela tinha um caso com Mário. Além disso, o advogado de Marcelly chegou a dizer que a cliente e Rafaela tiveram um envolvimento amoroso no local antes da chegada de Igor e Mario no apartamento.
Igor Peretto foi morto a facadas e teria ficado tetraplégico [sem movimento do pescoço para baixo] se tivesse sobrevivido. A informação consta em laudo necroscópico obtido pelo g1. Três pessoas próximas à vítima foram presas: Viúva, irmã e cunhado.
Prisões
Mario, Marcelly e Rafaela, investigados pelo homicídio contra o comerciante Igor Peretto
Reprodução e Redes sociais
As mulheres se entregaram e foram presas em 6 de setembro, enquanto Mário foi detido após ser encontrado escondido na casa de um tio de Rafaela, em Torrinha (SP), no dia 15 do mesmo mês.
O trio havia sido preso temporariamente em setembro e, no início de outubro, a prisão temporária foi prorrogada. Na ocasião, a defesa de Rafaela chegou a entrar com pedido de habeas corpus, que foi negado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A Justiça de Praia Grande (SP) converteu as prisões do trio, de temporárias para preventivas, após a denúncia feita pelas promotoras Ana Maria Frigerio Molinari e Roberta Bená Perez Fernandez, do MP-SP.
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