

Conheça a comunidade Ubang, local onde homens e mulheres falam línguas diferentes – Foto: iStock/ND
Situada entre as colinas do estado de Cross River, no sudoeste da Nigéria, fica Ubang, uma comunidade agrícola comum, mas com uma característica peculiar: homens e mulheres falam línguas diferentes.
Essa diferença pode parecer estranha, mas na idade adulta, todos conseguem se entender perfeitamente, mesmo não usando as mesmas palavras para se comunicar.
Como homens e mulheres falam línguas diferentes?
As crianças passam os primeiros anos de vida com as mães. Então independentemente do sexo, todos aprendem o vocabulário feminino na infância. No entanto, por volta dos 6 anos de idade, os meninos passam pelo o que é chamado de “mudança de linguagem”.
Nessa mudança, pais, tios e irmãos mais velhos começam a corrigir qualquer termo feminino. Em poucos meses, os meninos migram para o vocabulário masculino.
As meninas, por sua vez, mantêm o vocabulário que já conhecem.
Na adolescência, a divergência é completa: dois códigos de fala, que podem ser entendidos por ambos os gêneros, mas com palavras diferentes, que coexistem em uma mesma casa.
Como as linguagens podem ser diferentes?
O linguista Ubang Chi Chi Dee Ndifon catalogou cerca de 400 palavras do vocabulário básico com variantes especificas de gênero.
Conforme o especialista, a gramática e a sintaxe permanecem as mesmas, então as frases são estruturadas de forma idêntica, mas os substantivos e verbos se invertem.
Por exemplo: um vestido é “kaket” para mulheres, mas “nki” para homens; um sapato é “abuo” para elas, e “okpok” para eles.
Por que os homens e mulheres falam línguas diferentes?
Na tradição oral, Deus deu ao povo Ubang três línguas: uma para homens, uma para mulheres e uma linguagem extra que desapareceu há anos.
Os anciões contam que Deus julgou que homens e mulheres brigariam se falassem o mesmo dialeto, ou seja, dialetos diferentes trazem harmonia, segundo a tradição.
Em outra lenda é dito que a divisão aconteceu para evitar confusões em tempos de guerra, pois com uma só língua falada, bisbilhoteiros inimigos não conseguiriam decifrar o que era dito.
Embora os historiadores duvidem que essas lendas sejam reais, eles afirmam que as histórias estão entrelaçados na identidade do povo Ubang.
Como isso aconteceria se fosse no Brasil?
Em Ubang, homens e mulheres falam línguas diferentes, mas será que isso funcionaria no Brasil? Veja abaixo, como seria a convivência de gêneros com dialetos diferentes em terras brasileiras:
Possíveis raízes linguísticas
Os estudiosos levantaram várias hipóteses para explicar o porquê homens e mulheres falam línguas diferentes:
- Teoria do contato: Ubang fica perto de uma rota comercial histórica; o contato contínuo com dois grupos linguísticos vizinhos pode ter semeado dois vocabulários;
- Jargão das sociedades secretas: em muitas culturas nigerianas, as sociedades de iniciação masculina e feminina cultivam a fala codificada;
- Empréstimo de prestígio: se os caçadores (tradicionalmente homens) aprendessem termos especializados de aliados, e os fazendeiros (geralmente mulheres) mantivessem palavras mais antigas, a divergência poderia crescer de geração em geração.
Apesar das muitas explicações, nenhuma se mostrou definitiva, mas a maioria dos linguistas concorda que a divisão é local, não imposta por domínio colonial ou pro migração recente.
O cotidiano em um mundo com duas linguagens
O local onde homens e mulheres falam línguas diferentes não possui uma divergência linguística, pois o vocabulário duplo é tratado como um marcador lúdico de status.
Ou seja, homens provocam mulheres por usarem “palavras de bebês”, enquanto as mulheres retrucam que a fala dos homens soa de “maneira áspera”.
Em grupos mistos, os falantes raramente trocam as palavras. Em vez disso, cada um usa seu próprio dialeto enquanto tentam entender o outro.
Ubang é uma linguagem quase extinta?

Comunidade onde homens e mulheres falam línguas diferentes chama atenção – Foto: iStock/ND
A herança Ubang é frágil. A maioria dos jovens adultos migram para Calabar ou Lagos para estudar, onde o inglês e o pidgin nigeriano predominam. Quando retornam para casa, nas férias, sua fala é misturada com gírias urbanas.
Enquanto isso, na educação básica, as crianças são ensinadas na escola a falar inglês e depois Ubang.
No entanto, para preservar a linguagem Ubang, líderes comunitários iniciaram aulas noturnas informais e projetos de gravação para gravar e documentar os dialetos antes que a língua entre em extinção.